Conta um conto

terça-feira, 26 de março de 2024

Central dos Autônomos

 O apartamento 101 era onde se reunia o núcleo mais jovem do prédio. Pessoas que ainda tinham muitos sonhos ainda a ser conquistados, muitas frustrações e corações partidos que despontarão no horizonte provisoriamente longínquo em suas vidas. Vivem e desfrutam do sabor de cada momento tentando ganhar o pão de cada dia aos trancos e barrancos. 

Os cinco habitantes que dividem o aluguel são a confeiteira Isabel, Leila que passeia com cachorros e ocasionalmente faz bico de babá, o motoboy Maurinho, o motorista de aplicativo Plínio e o fotógrafo Sócrates. Não se sabe ao certo como e quando esse time foi formado, mas as relações interpessoais são bastante respeitosas, caso contrário esse esquema não funcionaria.

 Todos desviam uma parte do seu limitado orçamento para pagar as contas e o aluguel, embora insistam em fazer festas quase todo dia, sem considerar a economia necessária para andar com os pagamentos em dia. Isso gera várias discussões, pois alguns tentam ser mais responsáveis enquanto outros só querem curtir sem se preocupar com o dia seguinte.

_ A gente precisa de um jarro, colocar tudo certinho numa planilha ou então todo mês vai ser esse stress. Não aguento mais essa incerteza, gente. Não consigo nem dormir direito. _ pontuou Isabel, que acaba sendo uma espécie de irmã mais velha do grupo.

_ É uma boa ideia, mas nós dois somos minoria aqui. _ afirmou Plínio que tinha um leve interesse amoroso na cozinheira.

_ A gente precisa dessas reuniões para conhecer possíveis novos empregadores, é assim que funciona hoje em dia. Esse negócio de mandar currículo já era. _ disse Maurinho para defender o esquema atual de curtição.

_ Eu também gosto de diversão, mas pelo menos não fico inventando desculpa fajuta para me justificar. Eu só assumo e pronto. A gente rala tanto, aguenta tanta gente insuportável que é bom ter uma válvula de escape.

_ O que vem de baixo não me atinge. _ disse o motoboy fazendo uma brincadeira com a baixa estatura da moça. _ ainda não entendo como você carrega uns cachorros que são duas vezes o seu tamanho. Se botar uma sela dá para você cavalgar igual cavalo.

A garota respondeu apenas fazendo uma cara feia e dando a língua para ele, sem intenção de começar uma briga.

Sócrates encerrou a discussão propondo um meio termo entre os dois lados, tendo em vista que ele é o mais diplomático, sempre evitando conflitos, chegando inclusive a sofrer bastante com isso, pois acaba assimilando emocionalmente muita energia ruim que deveria ser extravasada, mas fica presa ocasionando tiques e dores de cabeça.

Assim os dias caminhando, como uma montanha russa onde o destino era incerto quando surgiu um evento que traria oportunidades para o quinteto: Adelaide, uma das patroas de Leila afirmou que sua filha iria se casar e estava pensando em fazer a festa com um orçamento mais modesto, porque ela estava economizando para fazer uma viagem, o que obviamente gerou várias discussões dentro daquela família. Isabel ficou responsável pelo buffet, Sócrates pelas fotos e Plínio ficaria na área para o transporte de alguns convidados. 

Leila por sua vez iria como convidada e Maurinho era o único sem motivo aparente para ir, mas por acaso ele era o ex da noiva e ainda não havia superado o término. Isso gerou uma tensão enorme no grupo, que antecipava uma tempestade se formando. A passeadora de cães era a mais preocupada, pois um desastre dessa magnitude poderia lhe custar uma de suas empregadoras mais rentáveis. Ela chegou até mesmo a pensar em dopar o motoboy com o Rivotril que usava para dormir, mas depois achou aquilo tudo muito extremo e desistiu da ideia.

Todos então se reuniram para conversar com o rapaz para que ele não fizesse nada que fosse gerar algum problema naquele evento tão importante para todos eles. Explicaram de todas as maneiras possíveis para que ele entendesse, mas ainda assim Maurinho não aceitava que ela ficasse com outro que não fosse ele. Começou então a pensar secretamente em maneiras de sabotar aquele casamento. Estaria lá de qualquer jeito para atrapalhar, nem se fosse como penetra.

Apesar de todo aquele possível contratempo, o resto do pessoal continuou investindo nos seus afazeres para entregar o melhor serviço possível, acreditando que aquele seria um grande cartão de visitas para catapultar suas respectivas carreiras.

Quando enfim chegou o dia do grande evento, todos estavam mais do que prontos para dar o seu melhor. Capricharam no visual e foram no carro de Plínio. Maurinho resolveu tentar a sorte em meio a todo aquele infortúnio que o cercava e resolveu comprar um bilhete de loteria, para ver se ganhava algum dinheiro e melhorava o seu humor naquele momento. O sorteio sairia em alguns dias, mas pelo menos lhe deu algo para pensar que não fosse a ex-namorada. Deitou-se na cama e ficou olhando o teto depois que todos saíram.

A decoração da festa estava bastante chique. O grupo chegou com algumas horas de antecedência, para deixar tudo preparado. Plínio, Leila e Sócrates foram para a igreja, enquanto Isabel ficou arrumando a comida na recepção, que era em um enorme sítio da família.

Quando chegou o momento da festa, estava tudo pronto e muito bonito. Uma das madrinhas começou a flertar com o fotógrafo, deixando a passeadora de cachorros com muito ciúmes, sentimento esse que era desconhecido até mesmo para ela. Tinha muita afinidade com Sócrates e o achava atraente, mas nunca tinha pensado em nenhum envolvimento com ele até aquele momento. Se sentiu confusa. Aquela sensação era nova, diferente e ela não sabia lidar com isso. Seu primeiro impulso foi puxar o cabelo da garota e fingir que tinha acidentalmente prendido a sua pulseira nas madeixas dela. Depois disso o rapaz se afastou das duas, sem entender nada.

As crianças ficaram entediadas na festa e resolveram fazer uma travessura. Enquanto todos estavam distraídos dançando elas resolveram soltar os cachorros do canil, sendo que entre eles estava o Dogue Alemão Maximus, que tinha aproximadamente 90 cm de altura. A matilha entrou correndo no meio das festividades, atraída pelo cheiro da comida e derrubando tudo. Os garçons ganharam dentadas nas pernas para assim soltarem as bandejas. Os risos dos pequenos logo denunciaram a sua autoria do delito. Foram sentenciados a ficarem detidos em um dos quartos da sede, até a festa acabar.

O primeiro impulso de Leila foi tentar conter os cachorros, mas seus reflexos estavam prejudicados porque ela tinha decidido beber para sublimar os seus sentimentos pelo fotógrafo. Pulou para agarrar o pescoço do imenso canídeo, mas acabou errando o alvo, ficando assim presa (dessa vez de verdade) ao dogue alemão, que se desequilibrou e caiu em cima dela. Todos começaram a rir com exceção do fotógrafo que se prontificou a salvar a sua amiga. Quando a passeadora foi tentar dizer alguma coisa, novamente a madrinha interveio e puxou Sócrates pelo braço, levando-o para longe dali. 

A garota solitária e confusa deitou-se num banco de madeira branca e ficou olhando o céu estrelado, esperando aquilo tudo acabar rápido. Sentiu uma súbita vontade de chorar, mas não sabia explicar porque aquilo estava acontecendo com ela.

Plínio enquanto isso tinha certeza do que sentia por Isabel e buscava as palavras certas para demonstrar o seu afeto. Era complicado porque isso poderia afetar a sua convivência dentro do apartamento, caso fosse rejeitado e ficasse um clima constrangedor residual. Por fim sentou-se em um banco perto da cozinha e ficou olhando o vazio, refletindo sobre tudo aquilo.

_ Você está bem? _ disse Bebel lhe fazendo um cafuné na cabeça. _ Tá com uma cara estranha...

_ É difícil explicar. Estou a fim de uma garota, mas tenho medo de ser rejeitado.

_ Porque ela faria isso? Você é simpático, atraente. Acho que ela teria muita sorte em ficar contigo.

_ Não acho que ela gosta de mim desse jeito.

_ Você não vai saber até perguntar.

_ Sei não. Acho que vai piorar as coisas.

_ Fecha os olhos.

_ Hã?

_ Vai, fecha os olhos.

Assim que ele fechou os olhos ela o beijou nos lábios. Quando ele os abriu, ela sorriu e disse:

_ Nossa, você é lerdinho mesmo, hein?

Ele olhou confuso e Isabel o beijou de novo. Obviamente a mulher já tinha percebido as intenções do rapaz há muito tempo e sentiu que se ele não tomasse uma atitude, ela teria que se adiantar, nem que fosse para encerrar aquela inconstância.

De repente Maurinho apareceu na festa, todos ficaram apreensivos, menos Leila que continuava inerte afogando as suas mágoas. Sócrates se adiantou e foi abordar o intruso:

_ Veja lá o que você vai aprontar. Nossas carreiras estão à prova hoje. Não ponha tudo a perder.

_ Não se preocupe com isso, já desencanei.

Estava bêbado de cachaça e desmaiou em cima de uma das mesas. Um dos convidados que era mais idoso, não aguentou tanta emoção depois dos cachorros e acabou enfartando. A ambulância levou o velhinho e de quebra pegou também a passeadora de cachorros, que estava precisando urgente de uma injeção de glicose. Sócrates aproveitou e a acompanhou nesse trajeto:



_ O que aconteceu com você hoje?  Estava tão focada e de repente começou a encher a cara, não entendi nada.

_ Porque você não aproveitou e ficou com a sua amiguinha?

_ Que amiguinha? Do que você está falando?

_ A garota da festa que estava se oferecendo para você. Não percebeu?

_ A madrinha? A gente tava conversando, qual o problema?

O diálogo terminou ali porque a moça desmaiou. Quando ela despertou não se lembrava de mais nada, mas passou a sentir algo diferente pelo fotógrafo, que ela precisava processar antes de seguir em frente com aquilo. Maurinho ganhou uma pequena fortuna, mas antes de pensar em fazer uma festa refletiram sobre o enfarto do velhinho e decidiram abrir uma caderneta de poupança, porque afinal de contas a vida é breve, mas nem por isso precisamos viver no limite o tempo todo. A melhor forma de riqueza é aquela onde você possui dinheiro o bastante para não precisar se preocupar com ele.

quinta-feira, 21 de março de 2024

Dois apartamentos e um zelador

     Isidoro e Otília se mudaram ainda jovens para o Edifício Solares. O ano era 1964 e eles tinham 10 anos cada um. A menina morava no apartamento de cima, o rapaz logo abaixo dela. Haviam poucas crianças no prédio, que era ocupado em sua maioria por artistas boêmios que tinham ideias subversivas, sendo posteriormente perseguidos, torturados e mortos pelos militares. O único companheiro delas era Atanagildo Pereira, filho do zelador. O trio cresceu junto e ficou bastante íntimo.

Passaram se muitos anos e agora eles eram jovens, na faixa dos vinte anos. O rapaz começou a nutrir sentimentos pela sua vizinha, mas tinha medo de criar uma situação desconfortável e perder a amizade da moça. Sua timidez também impedia que ele se relacionasse com outras garotas na escola, fazendo com que ele se tornasse cada vez mais introvertido. Além disso, só tinha olhos para Otília, com quem tinha uma amizade muito forte. Não estudavam na mesma escola, por divergências religiosas por parte dos pais, já que uma instituição era metodista e a outra era católica. Compensavam essa ausência conversando entre si sempre que podiam.



Certo dia a garota lhe confessou que estava interessada em um rapaz que estudava com ela. Ele ficou normal diante dela, embora estivesse todo quebrado por dentro. Obviamente ele não lidou bem com aquela situação e começou a ficar cada vez mais recluso, sentindo-se rejeitado. Ela não entendeu nada, ficou triste e terminou sendo consolada por Atanagildo, com quem acabou namorando.

Isidoro ficou bastante chateado com aquilo tudo e cortou relações com os dois, durante muito tempo. Era uma raiva que ele não conseguia explicar, um orgulho ferido que não tinha a menor intenção de cicatrizar, pelo menos não tão cedo. Enfiou a cabeça nos estudos e entrou para a faculdade de engenharia, sem deixar de acompanhar de longe o progresso de Otília, que sempre esteve em seus pensamentos. Ela resolveu fazer Letras, queria muito ser professora como sua mãe.

Ele se envolveu com várias mulheres, mas nunca se casou, pois nenhuma se comparava ao seu primeiro e único amor. O relacionamento físico ia bem, mas não suportava a convivência diária. Não sentia nada em comum, se sentia avulso, deslocado, por mais que tentasse. Nunca conseguiu superar a ausência da moça que se casou, indo morar longe dele e do seu primeiro ex, que agora assumia a vaga do pai como faxineiro do prédio.

Atanagildo, que nunca foi muito de estudar, se resignou a seguir o caminho de seu antecessor, por puro comodismo. Não tinha grandes aspirações, ali ele recebia um salário fixo, dormia em um anexo no térreo e ainda tinha facilidade de contato com as diaristas. Estava feito.


O tempo foi passando e Isidoro acabou ficando com o apartamento, depois que os seus pais faleceram. O zelador então se reaproximou de seu amigo nesse momento fúnebre.

_Você sempre tem essa tática, né? Ganhar o coração das pessoas quando elas estão tristes, vulneráveis. _ disse o inquilino enquanto era abraçado.

_ Simplesmente acho que isso não se nega a ninguém. E eu estou sempre pronto a oferecer.

_ Isso é muito humano da sua parte. Por isso não dá para ficar com raiva de você.

_É, mas por conta desse seu faniquito, acabou perdendo alguém que significava bastante para você.

_ Ela e você também, né?

_ Você nunca me perdeu. Eu estava só esperando você ficar pronto para voltar.

_ Não é à toa que ela preferiu ficar com você do que comigo.

_ Você gostava dela?

_ Não sabia? Achei que estava implícito.

_ Cara, se você não falar as coisas, ninguém vai adivinhar. Você precisa parar de achar que as pessoas leem a sua mente.

Nesse momento Isidoro percebeu o quanto esteve equivocado por todos aqueles anos. Já estava velho e não tinha se declarado para a única mulher que ele tinha realmente amado em toda a sua vida. Sentou se na poltrona que ficava na sala, perto da janela e ficou observando aquele ambiente vazio por várias horas, até a escuridão tomar conta de tudo.

Decidiu adotar um cachorro, um basset hound chamado Salim para ter uma companhia quando não estivesse lendo livros ou vendo filmes e séries na televisão. Aceitou seu estilo de vida solitário, que acabou se tornando estranhamente confortável para ele. Fazia também algumas atividades com Atanagildo, que aderiu ao estilo de vida sem relacionamento fixo, onde segundo ele havia mais liberdade.


Estava indo tudo seguindo uma relativa paz quando um rosto familiar retornou, após a morte do marido. Otília e sua gata angorá Matilde voltaram para o apartamento que era dela e estava vazio há bastante tempo, desde que os pais dela se separaram. Não quiseram vender porque haviam decidido que era herança da filha e ela faria o que quisesse com ele. A moça pensou várias vezes em se desfazer do imóvel, mas sempre arrumava uma desculpa para ir adiando. Agora estava de volta, mais amarga e cínica, sem a mínima vontade de socializar.

Isidoro sabia que teria um grande caminho a percorrer para reconquistar o carinho de alguém que ele havia deliberadamente abandonado sem motivo aparente. Inicialmente pensou em mandar seus pêsames através do faxineiro, mas depois decidiu ir pessoalmente. Tocou a campainha e ela não atendeu. Talvez não estivesse em casa, embora Atanagildo tivesse garantido que a viúva não saiu. Decidido a não perder a viagem ele gritou no corredor:

_ Sinto muito pela morte do seu marido! E sinto mais ainda por ter me afastado de você, tá bom? Você é a única mulher que eu amei na vida e eu sinto demais a sua falta!

O silêncio permaneceu no local. Alguns curiosos observaram a cena pelo olho mágico, mas não tiveram coragem de sair e lhe dar um abraço após aquele momento claramente constrangedor. O velho estava triste, mas aliviado pois não sabia como ela reagiria. Poderia lhe bater ou lhe dar um beijo. Foi preparado para as duas reações e não teve nenhuma. Foi ruim, mas sinceramente não tinha certeza se sobreviveria ao tapa. Naquele dia ele foi para casa com um sentimento agridoce em seu coração.


Nos dias seguintes começou a deixar pequeninos vasos de flores na porta, na expectativa de pelo menos amolecer um pouquinho o coração dela e ao mesmo tempo se redimir dos erros cometidos no passado. Otília por sua vez ficou com raiva e jogou todos aqueles vasos no lixo, embora a sua vontade fosse de atirar todos eles na porta do seu vizinho de baixo. Não precisava de consolo, carinho ou bajulação. Só queria ser deixada em paz com sua gata sem ser importunada até o fim dos seus dias.

Isidoro se sentiu pessoalmente responsável por ela ter se transformado numa pessoa tão fechada, pois o seu afastamento fez com que ela perdesse alguém que poderia estar lhe fazendo companhia agora, ajudando nesse momento difícil. Sua atitude não foi só imatura. Foi covarde e egoísta também. Ele demorou a compreender como aquele ato tinha se mostrado tão nocivo a longo prazo. Ela precisava de desculpas genuínas, não de simples gestos de carinho.

Otília precisava saber que ele tinha noção do tamanho do estrago que o seu afastamento havia causado em sua vida. E assim ele fez. Sentou-se numa mesa, pegou lápis, papel e derramou todos os seus sentimentos numa carta que seria sua derradeira alternativa para derrubar aquela muralha entre eles que Isidoro inadvertidamente havia construído. Pediu ao zelador para entregar à sua vizinha em mãos e se certificar de que ela havia lido. Muitos dias se passaram. Ele estava a ponto de perder as esperanças quando de repente a campainha tocou. Quando abriu a porta tomou um soco no estômago de Otacília que chorando lhe disse:

_ Porque você demorou tanto tempo para fazer isso?

_ Você precisa me dar um desconto. Eu sou homem, poxa. _ disse o velho gemendo com a mão na barriga.

Ela lhe deu um beijo na testa e perguntou:

_ Não vai me convidar para entrar?

_ Depende, você vai me bater mais?

_ Só se você merecer. _ respondeu ela sorrindo.

Finalmente depois de tantos anos eles se abraçaram.

_ Você não faz ideia da falta que fez em minha vida.

_ Faço minhas as suas palavras.


A partir daquele momento eles nunca mais se separaram. Ficavam namorando e alternando os apartamentos, pois nenhum dos dois quis se desfazer do próprio imóvel. Além disso, sentiam mais liberdade para conviver com as suas próprias manias e excentricidades sem o risco de gerar algum tipo de desavenças, afinal de contas a última coisa que eles queriam naquela altura da vida era brigar e recomeçar tudo de novo.

quarta-feira, 20 de março de 2024

Apartamento 303

Amadeus Gontijo trabalhava como detetive particular, seguindo pessoas e tirando fotos de flagrante adultério. Abandonou qualquer tipo de moral ou ética depois de quase morrer de fome seguindo princípios. Era ganancioso e não se orgulhava, tampouco se envergonhava. De acordo com a sua ótica, estava apenas evidenciando os vacilos dos outros. Nunca precisou fazer nenhum tipo de montagem para expor os vilões de sua narrativa. Sentia um pouco de pena das mulheres que eram traídas, mas nunca dos homens, porque para ele era um claro sinal de que eles estavam satisfazendo as moças. Tinha um assistente chamado Abel que fazia as compras para ele e dirigia o carro (que era do ajudante). Seguiam essa rotina sem problemas até que um dia apareceu uma mulher linda em seu escritório/apartamento e disse a ele:



_Boa tarde, meu nome é Verônica Pavão. Meu marido descobriu que eu o estou traindo e ele quer me matar.

O detetive cuspiu o uísque barato que estava tomando e perguntou assustado?

_ A senhora tem alguma prova disso? Quem te indicou e porque você não foi direto na polícia?

_ Meu esposo Alair é amigo de infância do delegado. Se eu falecer ele arquiva o caso. Talvez até já tenham combinado isso.

_ Você sabe se alguém te seguiu até aqui?

_ Não que eu saiba.

_ Esse caso é interessante. Vou precisar de afiar todos os meus instintos. Abel, traga a vodka boa. Não aquela vagabunda que eu uso para escovar os dentes. A que está presa no congelador. A senhorita quer alguma coisa?

_ O senhor tem calmante?

_ Não, mas tenho muito álcool. Pode escolher a bebida que quiser que eu te sirvo.

_ Quero absinto então.

_ Porra, mas aí você foi longe, né? Quem compra essa porra? Enfim pode ser um vinho?

_ Vinho está ótimo.

_ Abel, traz um vinho para a moça. Coisa boa. Se trouxer vinho de cozinha eu quebro na sua cabeça.

_ Vocês têm uma parceria um tanto tóxica, não?

_ Não, é só um pouco de amor bruto. Ele está acostumado. Antes eu batia, hoje eu só xingo. Nossa relação está evoluindo, sabe?

_ Fico feliz em saber disso. _ respondeu a moça.

_ Mas me conte os detalhes. A partir de hoje você fica sob os nossos cuidados. Tem dinheiro?

_ Tenho, isso não é problema.

O rapaz trouxe uma taça de vinho, que ela acabou virando numa só golada.

_ Bom, eu sou casada com o Alair há sete anos. Ele é dono da rede de supermercados TANAM.

_ Sério? Nossa, eu compro muita coisa lá.

_Ele é muito ocupado e viaja bastante. Aí acabou rolando um lance com Daru o meu professor particular de Yoga e dono do centro Respirah! De Meditação. Meu marido é muito ciumento e disse que se fosse traído, mataria todos os envolvidos.



_Ok e como você sabe que o Alair descobriu?

_ Meu amante está morto. Foi assassinado. _ após dizer isso ela começou a chorar.

_ Será que ele não foi morto por algum outro motivo?

_ Acho muito difícil, ele era muito tonto, muito inocente. Não tinha maldade no coração, sabe?

_ Mas tava pegando mulher casada, não era tão inocente assim. _ Abel interferiu.

Amadeus fez um gesto silencioso com a cabeça para o seu assistente, pedindo para que ele não se intrometesse na conversa. Voltando-se para a moça, perguntou:

_ Eu sei que é um assunto difícil, mas sabe dizer como ele foi assassinado?

Nesse momento o celular dela tocou. Era o marido.

_ É ele! O que eu faço?

_ Respire e atenda normalmente, como se nada tivesse acontecido. A gente te dá privacidade. Vamos para a cozinha, Abel.

Os dois se retiraram e ela ficou conversando no telefone. Depois que desligou ela começou a chorar e gritar:

_ Ele sabe! Ele sabe! Eu vou morrer! Eu vou morrer!

Os dois entraram correndo na sala. Amadeus perguntou:

_ O que aconteceu? Como foi a conversa?

_ Ele sabe! Ele sabe!

_ Ele te disse?

_ Praticamente disse.

_ Como assim?

_ Ele disse que eu era a coisa mais importante da vida dele e me amava mais que tudo...

_Agora fiquei confuso.

_Ele nunca me disse isso. Ele provavelmente está gravando a ligação para ter um álibi quando me matar.

_Isso não é inteiramente impossível. _ o ajudante novamente interveio.

_Abel, vai comprar uma rabanada lá embaixo. Traz uma dúzia.

_ Uma dúzia? Mas quem vai comer isso tu...

_ Porra, traz uma dúzia de rabanadas que eu vou distribuir no sopão dos mendigos! Vai logo!

O assistente saiu sem entender nada. Quem iria pagar pelas rabanadas? Ele nunca tinha feito caridade...assim que começou a descer as escadas entendeu porque tinha sido expulso do recinto e riu sozinho. Amadeus decidiu voltar ao assunto do assassinato do instrutor, afinal de contas as duas coisas provavelmente poderiam não estar relacionadas e ela estaria se preocupando à toa.

_ Ele foi encontrado congelado dentro de um freezer de frigorífico, fazendo a pose da Flor de Lótus.

_ Ok, isso é bem incomum. E você acha que os assassinos arrumaram o cadáver dele assim?

_E você acha que ele iria se trancar dentro de um freezer para meditar?

_ Sei lá, você mesma disse que ele era burro.

_ Burro não, eu disse tonto. É diferente.

Amadeus não entendeu a diferença, mas deixou quieto. Por fim ele disse:

_Ainda não entendi a parte do assassinato.

_ Isso que é o genial. É um assassinato que não parece assassinato. O freezer era do supermercado do Alair, você não está vendo a conexão?

_ Você está afirmando que o seu marido colocou um revólver na cabeça do seu amante e mandou ele ficar trancado nessa posição dentro de um freezer, mesmo sabendo que ele iria congelar e morrer do mesmo jeito?

_ Tá vendo? Agora concordamos que ele foi assassinado!

_ Nossa, agora você bugou a minha mente. Mas se ele não fizesse a posição, iria tomar o tiro na cabeça e isso iria dificultar para o assassino, que teria que se livrar do corpo. Além disso, ele morreria mais rápido. E porque manter a posição depois que a porta se fechou?

_ Sei lá, ele é tonto. Já disse. Era tonto, melhor dizendo.

_ Minha senhora, sinceramente eu acho que não há caso nenhum. Esse homem deve ter se trancado lá por acidente por causa do silêncio para poder meditar em paz. Na minha opinião ele é um sério candidato ao Darwin Awards, nada mais que isso. Eu gostaria muito de ganhar dinheiro com essa sua teoria maluca, mas estaria perdendo o seu tempo e o meu. De qualquer forma recomendo que a senhora durma hoje num hotel e tome cuidado com o seu marido, caso eu esteja errado, só por via das dúvidas.

_ Será que eu estou me preocupando à toa?

_ Talvez sim, embora todo cuidado seja pouco. Contrate um guarda-costas, diga para ele que você não tem se sentido segura ultimamente. Faça questão de incluir testemunhas quando disser isso. Eu vou deixar o seu depoimento registrado e se alguma coisa acontecer com você eu te garanto que contarei tudo o que sei para a polícia.

A moça se levantou, meio desconcertada e foi saindo devagar em direção à porta. Agradeceu o tempo dispensado e desceu as escadas pensando nos conselhos de Amadeus. No caminho cruzou com Abel, que lhe ofereceu uma rabanada.

terça-feira, 19 de março de 2024

A viagem dos Pelicanos

 

O apartamento 202 do Edifício Solaris era a sede do encontro mensal da Confraria dos Pelicanos, um grupo de amigos desde os tempos de faculdade. O nome surgiu em função do perfil da ave em questão, sempre solitária e malvista por onde passa. Lá eles se sentiam à vontade para desabafar sobre os seus problemas e beber bastante, além de jogar baralho e jogos de tabuleiro. O grupo era formado pelo dono do apê e bancário Alexandre que nunca tinha sucesso com mulheres, o veterinário Cassiano preso num casamento sem amor, o mulherengo DJ Michel e Astolfo, um professor de escola estadual e pai de gêmeos, constantemente sonolento e cansado por motivos óbvios.


_Essas reuniões são o ponto alto do mês para mim._ disse o anfitrião enquanto sacudia um dado em sua mão._ deixam minha vida mais suportável.

_ Odeio admitir isso, mas é o único lugar onde me sinto realmente em casa._ concordou Cassiano.

_ Eu adoro vocês, mas sempre achei que seria melhor se tivesse mulheres. Essa festa de cuecas é deprimente, desculpa falar._ afirmou Michel

Os três olharam para o professor que não se pronunciou porque estava apagado no sofá. Eles concluíram que aquele deveria ser o único momento em que ele se sentia verdadeiramente relaxado para descansar e por isso não o incomodavam.

_ Esse não é o propósito dessas reuniões e mesmo se fosse, garanto a vocês que ainda arrumaria um jeito de terminar a noite na seca como sempre.

_ Você precisa sair mais comigo, vou te levar nuns lugares bacanas.

_ Eu não tenho o que reclamar em relação a mulheres. Eu amo a minha esposa, mas ela não me deixa fazer as coisas que eu realmente gosto. Fui cedendo tanto sem perceber que hoje sinto que me tornei uma sombra de quem eu realmente era.

_ Porque você não se divorcia dela?

_ Sei lá, acho que é porque não vou achar ninguém melhor.

_ Quem disse?

_ Sei lá, eu demorei tanto a achar alguém que me suporte. Eu sei que sou uma pessoa difícil. Eu a amo por suportar a minha convivência.

_ Cara, isso é muito triste.

Os três ficaram em silêncio por bastante tempo. O veterinário quebrou o silêncio:

_ Olha, ela não é uma pessoa ruim.

_ Ninguém disse isso.

_ Mas eu sinto que dei essa impressão.

_ Gente, vamos mudar de assunto? _ disse Alexandre claramente incomodado com toda aquela situação. _ Ele desabafou e agora vamos seguir em frente.

_ Esse é exatamente o problema. _ disse Michel. _ todo mundo vem aqui, chora as pitangas e segue em frente. A gente precisa fazer alguma coisa a respeito. Não podemos ficar só nessa terapia paliativa para superar a existência. A gente precisa viver! Viver de verdade! Fazer isso uma vez só não vai matar ninguém. A gente precisa dessa catarse. Vocês são praticamente a minha família. Pegar mulher é bom, mas é bastante solitário também, podem acreditar. Acho que por isso me interessei tanto nessa declaração do Cassiano. Desculpe se fui invasivo.

_ Não, eu gostei de comentar sobre isso. Não se preocupe. Fui eu que comecei, afinal de contas.

_Acho que a gente precisa arrumar uma maneira de estender esse nosso contato. Estamos precisando de uma espécie de intensivão, onde todos tenham a oportunidade de se ajudar para sair desse marasmo emocional em que estamos. _ refletiu Alexandre.

_ O que você está propondo? Uma viagem? Para onde a gente iria? _ perguntou Michel.

_ Uma viagem seria legal. A gente podia acampar, pescar… _ disse Cassiano.

_ Eu gosto de pescar, mas a gente precisa incrementar a nossa sociabilidade. Não a minha, mas a de vocês. _ rebateu o DJ

_ Vamos pesquisar um festival em uma cidade aqui perto. Alguns dias com muita festa e bebidas. A gente está precisando de algo assim, não é?

_ Agora você está pegando o espírito da coisa! Vamos sair dessa zona de conforto, pessoal!


Resolveram então ir para a Festa da Cachaça em Abreus. Cada um fez a sua própria programação, conseguindo folgas no trabalho e fazendo reservas na pousada da cidade. Partiram no Gol vermelho de Alexandre que montou até uma playlist para animar o pessoal. A viagem durou algumas horas e eles tiveram bastante tempo para conversar no carro. Michel aproveitou para dar umas dicas de pegação para o amigo bancário:

_ Cara, posso te falar uma coisa? Por favor não se ofenda.

_ Pode falar, você é irmão.

_ É sobre a sua abordagem com a mulherada.

_ O que tem ela?

_ Você tem que ser mais desapegado. Elas sentem a sua carência de longe, não curtem.

_ Eu sou romântico, qual o problema?

_ Romântico não, é desesperado mesmo.

_ Isso realmente é um choque para mim.

_ Me desculpe por ser tão direto. Já devia ter conversado isso contigo antes.

_ Tranquilo, sem problemas.

Alexandre aproveitou para mudar de assunto e perguntou a Cassiano:

_ E você, quais os planos para a nossa viagem?

_ Não sei, vou aproveitar esse tempo longe da patroa para curtir, pensar na vida, sei lá. Estou indo mais pela farra mesmo, sem expectativas.

Astolfo dormia um sono pesado com a cabeça apoiada na janela. Era o único que dispensava quaisquer explicações sobre eventuais motivações para aquela viagem.


Depois de um tempo acabaram chegando ao seu destino. Se instalaram na Pousada e saíram para ver as atrações da cidade. O professor estava desperto, como se tivesse recobrado as suas energias, ansioso para retomar o tempo perdido. A típica cidade do interior mineiro ganhou o coração dos turistas sem fazer esforço. Os estandes estavam começando a ser montados, assim como o palco onde aconteceria o show da banda Pedra Letícia à noite. O olhar curioso dos pelicanos chamou a atenção de uma moça que obviamente percebeu que eram de fora e os convidou para tomar um café em sua padaria. Mia era o seu nome. Alexandre ficou encantado pela moça e já estava se adiantando quando foi interrompido pelo DJ que sussurrou no seu ouvido:

_ Pega leve. Lembra do que eu te falei. Sem ansiedade.

O bancário respirou fundo e manteve a conversa despreocupado. Astolfo estava incrivelmente animado e já foi perguntando sobre as melhores cachaças para beber na região. A moça respondeu que havia uma marca famosa chamada Brisa, nas opções Caipibrisa e Maracujá. O professor quis logo começar a beber, enquanto os outros três resolveram deixar para mais tarde. Ficaram sabendo de uma cachoeira muito bonita ali perto e foram tomar um banho para relaxar da viagem. Cassiano respirou fundo e sentiu um estranho alívio percorrendo por todo o seu corpo que fez com que ele gargalhasse alto sem motivo aparente.

_ Deveríamos ter feito isso há mais tempo. _ disse o veterinário com um sorriso de satisfação estampado em seu rosto.

_ É curioso como ficamos presos aos nossos hábitos a ponto de não percebermos a gaiola invisível que cresce ao redor da gente.

_ Nem bebeu e já está filosofando, Alex? _ perguntou Michel em tom de brincadeira.

_ Está tudo indo tão bem que estou prevendo que em algum momento essa viagem vai dar merda. _profetizou Cassiano.

_ Porque você diz isso?

_ Está tudo calmo demais. Parece filme de terror barato.

_ Você é neurótico. Acho que você sente falta do stress.

_ Eu estou estranhamente relaxado, para dizer a verdade. Acho que nunca me senti assim na minha vida.


_ O céu está azul, a pousada é ótima, só aproveita. Não pense no que virá. Só aproveite o momento.

O veterinário respirou fundo, olhou a água cristalina e só absorveu o instante. Depois de retornarem e almoçarem é que deram conta do sumiço do professor. Todos pensaram no que foi profetizado anteriormente, mas ninguém disse nada. Provavelmente estava bêbado e caído em algum lugar.

Quando escureceu eles começaram a beber. A multidão se formou na praça e a festa começou. Cassiano foi atrás do professor e o DJ se perdeu despreocupado no meio da galera. Alexandre completamente sem jeito resolver se sentar em um dos bancos da praça que estavam vazios. Nem percebeu quando Mia se sentou ao seu lado, mas sentiu uma descarga de ternura quando ela encostou a cabeça em seu ombro, já um pouco embriagada. Ela disse que por algum motivo se sentia bem ao lado dele. Uma espécie de calma reconfortante emanava do banqueiro, segundo ela. Ele resolveu seguir o que foi conversado na cachoeira e só curtiu o momento, sentindo a adorável fragrância floral que brotava dela. Fechou os olhos e colocou os braços ao redor da moça. De repente um beijo no rosto, depois na boca. E assim ficaram naturalmente juntinhos até o fim do Festival, sem forçar a barra, espontaneamente. Depois disso trocaram contatos e continuaram se falando, mesmo depois que eles foram embora. Não havia o compromisso de algo mais sério, ele já estava feliz de poder contar com o carinho da moça, mesmo que fosse à distância.


O veterinário achou Astolfo na cadeia por perturbação da ordem. O rapaz festejou de forma tão intensa que tirou a roupa e ficou muito louco com o excesso de cachaça. Depois de paga a fiança foi levado a um posto de saúde onde tomou glicose. De certa forma cada um acabou ganhando exatamente o que pretendia daquela viagem, que foi a primeira de muitas outras.

terça-feira, 12 de março de 2024

O reencontro de Boca Seca e Suspirante

 Jagunços pertencentes ao bando de Tião Maniva, cresceram bons companheiros e se apoiaram nos momentos mais difíceis. Eram como irmãos que a vida ajuntou com gosto. Cruzavam o sertão de cima a baixo, na chuva e no sol. Por conta dessa convivência era praticamente impossível esconder segredos um do outro.



Baltazar Siqueira, também conhecido como Suspirante por conta de um problema de respiração, começou a notar que seu colega Boca Seca, cujo verdadeiro nome era Ademir Serra, estava se ausentando do bando com relativa frequência, dando desculpas frouxas e se distanciando em geral de todos.

Perguntou a ele se estava com algum problema, poderiam resolver juntos qualquer empecilho que surgisse, mas ele sempre desconversava e dizia que estava tudo como sempre esteve, sem motivos para ficar alarmado ou receoso. Obviamente que seu amigo não acreditou e foi por conta disso que ele foi o único sobrevivente de uma chacina de seu bando, surpreendidos na madrugada pelo bando de Chiquinho Canoca.

Já estava cismado com a movimentação estranha do colega e não estranhou quando ele se levantou de madrugada para caminhar até um ponto isolado. Ficou observando de longe e notou que tinha se afastado demais para tratar de necessidades fisiológicas. Não fazia sentido. Quando voltou de sua incursão noturna Boca Seca estava trazendo um alforge gordo que ele prendeu em seu cavalo. Baltazar puxou a sua espingarda e deu um tiro na alça do mesmo, que despencou e caiu no chão espalhando moedas por todo lado.


_ Seu traidor desgraçado! O que você vendeu em troca desse ouro? Perguntou Suspirante com a voz embargada de um sentimento que misturava raiva e decepção.

Ademir não respondeu nada e começou a pegar o dinheiro, mas o bando rival já tinha começado o seu genocídio e ele resolveu subir em seu cavalo para fugir. Quando estava quase sumindo no escuro tomou um tiro no pé esquerdo que lhe deixaria manco pelo resto de seus dias, um presente de despedida daquele que um dia o considerou seu irmão.

Sem a menor chance de se defender, especialmente porque estava em menor número, Baltazar pulou num barranco e se deixou levar pela gravidade, arranhando seu corpo em moitas espinhosas de Gabiroba do Campo enquanto quicava rolando na superfície pedregosa de um barranco imenso. Seu corpo ficou estirado no fim de uma ribanceira até o cessar dos disparos. Se levantou com dificuldade e pensou em voltar para pegar suas coisas, mas provavelmente o grupo rival já teria levado tudo. Sem contar que estava muito estropiado para subir aquele aclive. Foi se arrastando por várias horas até alcançar o vilarejo chamado Pequis, onde iria recriar a sua persona.

Depois de encontrar a alma caridosa de Anastácia Flores, uma bela mulata que cuidou dos ferimentos do rapaz até o mesmo recobrar as suas forças. Terminou se casando e tendo dois filhos com a moça anos depois. Arrumou serviço no armazém de secos e molhados local do Seu Braz, que também funcionava como um boteco para os moradores da região. Funcionário dedicado, acabou herdando o estabelecimento depois que o dono já velhinho faleceu.

Baltazar se tornou uma figura muito querida na cidadela. Abandonou a bebida para melhor gerenciar seu comércio e nunca começava uma briga, sempre optando pela diplomacia quando tinha de lidar com clientes difíceis. Estava quase esquecendo a sua vida anterior quando o inevitável aconteceu.

Foi numa tarde abafada de fevereiro. Estava sentado atrás do balcão, fazendo a digestão da dobradinha que sua esposa tinha feito com tanto carinho, quando uma figura do seu passado adentrou o armazém. Tinha deixado a barba crescer e andava mancando com a perna esquerda. Se aproximou, pediu uma cachaça. Suspirante serviu uma dose, sem saber se tinha sido reconhecido. De qualquer forma manteve o revólver ao alcance da mão, caso tivesse que usar.

O homem virou a bebida com calma, saboreando o líquido. Depois de um breve silêncio disse:

_ Essa é da boa. Põe outra dose.

Baltazar serviu e ele repetiu o comportamento. Então finalmente falou:

_ Sabe, eu fiquei muito tempo lhe procurando.

_ É mesmo? _ indagou o vendedor enquanto já pegava no revólver. _ E por qual motivo?

_ Algumas pendências do passado.

_ Não sei do que você está falando.

_ Não se faça de desentendido. Não reparou que entrei aqui mancando?

_ Tá querendo devolver a bala que lhe dei? Pode ficar.

_ Eu vou lhe devolver a bala sim, depois que você me pagar as moedas que perdi naquela noite.

_ Você traiu seus companheiros, saiu vivo e ainda se acha no direito de cobrar alguma coisa? Dê graças a Deus e siga sua vida. Tenho nada com isso não.

_ Você se remontou. Eu não. Meu ódio e minha dívida são tudo o que me resta. Preciso saciar os dois para poder me olhar no espelho novamente.

_ E você acha que me matar e roubar vai resolver todos os seus problemas?

_ Se eu quisesse simplesmente lhe matar, já teria entrado atirando. Além disso, andei perguntando por aí e fiquei sabendo que agora você tem esposa e filhos. Muito interessante.

_ Seu problema é comigo. Eles não têm nada a ver com nossa briga do passado!

_ Eu sei, só queria usar isso para te tirar do sério e forçar a aceitar a minha proposta.

_ O que você quer, Boca Seca?

_ Quero o rendimento mensal da sua venda, que irei levar depois de tirar a sua vida num duelo.

_ E se eu não aceitar?

_ Aí eu mato todo mundo, sua família e quem aparecer na minha frente. Depois pego o dinheiro e vou me embora.

_ Vamos conversar, sejamos razoáveis. Nós já fomos como irmãos, lembra? De onde vem essa mágoa toda?

_Você sempre foi certinho demais, mesmo sendo jagunço você se achava superior a todo mundo. Sempre pagando de bom moço. Você é carne ruim, como eu! Éramos mercenários, prontos para matar o que quer que fosse. Não se faça de santo. Você não pode simplesmente apagar todos os seus pecados e fingir que nada aconteceu. Eu tenho problemas para subir num cavalo até hoje por sua causa! Você me quebrou e não quer pagar por isso?

_ Muitos amigos nossos morreram naquela madrugada por causa da sua traição. Nunca te perdoarei por isso. Esse tiro que dei no seu pé foi porque eu estava triste demais para lhe matar. Desviei a espingarda no último segundo.

_ Ah, então quer dizer que você ia me atirar nas costas e não fez em nome da nossa amizade? Muito obrigado por nada!

Dizendo isso Boca Seca esticou o braço para dar um murro em Baltazar, mas foi impedido pelo balcão que os separava.

_ Acho que já deu de cachaça para você.

_ Sua família devia conhecer esse seu outro lado.

_ Já te pedi para deixá-los fora disso. Eu aceito a sua proposta. Diga hora e lugar que estarei lá. Qual a garantia eu tenho de que você deixará a minha família em paz, caso eu venha a falecer?

_ Você vai ter que confiar em mim. Disse ele com um sorriso irônico.

_ Você acabou de me dar mais uma motivação pra lhe matar.

_ Estava contando com isso. Iria odiar se você pegasse leve comigo.

_ Quer resolver isso agora?

_ Não, eu preciso me preparar, como você sabe eu não estou sóbrio, mas preciso confessar que estou muito a fim de estragar o seu rosto.

_ Eu já estou mais que treinado em esquivar soco de bebum. Não preciso desse esforço a mais. Pode ir se embora.

_ Eu vou a hora que eu quiser.

Baltazar saiu por detrás do balcão e Ademir partiu para dar um soco nele. Seus movimentos estavam bem lentos por conta da aguardente e mais uma vez ele errou. Suspirante o agarrou pela roupa e atirou para fora do armazém, fazendo com que seu rival caísse de peito na rua de terra.

_ Vai curar essa ressaca em outro lugar e não me encha a paciência! _ gritou o ex-jagunço para sua visita indesejada.

Naquela noite Baltazar ficou em dúvida se contava ou não para a sua esposa sobre o encontro que teve mais cedo com seu antigo parceiro de crimes. Foi para o quintal da sua casa e ficou fumando um cigarro de palha enquanto pensava nas palavras de Boca Seca. Já tinha feito várias coisas bastante condenáveis, mas sempre procurou estabelecer um limite para não se tornar alguém com a moral tão repulsiva como seu amigo, que tinha entregue a vida de seus amigos por dinheiro sem nenhuma outra motivação aparente.

Deitou-se na cama e não conseguia dormir, precisava sobreviver a qualquer custo para proteger aqueles que amava. Estava fora de combate há bastante tempo e pensou ter deixado tudo aquilo para trás, por isso nem se preocupou em continuar praticando tiro ou luta de faca. Simplesmente não fazia sentido. Pela primeira vez em sua vida sentiu medo de morrer.

Quando se levantou para tomar café no dia seguinte todos perceberam que ele estava estranho e perguntaram se havia acontecido alguma coisa de errado, mas ele desconversou dizendo que eram assuntos relacionados ao trabalho. Abraçou forte os seus filhos e beijou apaixonadamente a sua esposa.

Antes de ir para o trabalho pensou em se afastar um pouco para treinar tiro em uns potes de conserva vazios. Sua mira não estava como antes, mas dava para o gasto. Ficou um pouco mais aliviado. Enquanto caminhava em direção ao armazém avistou Ademir sentado em uma cadeira no meio da rua de terra.

_ Cansei de esperar! _ Gritou ele de longe. _ Quero resolver isso logo para depois consolar a viúva!

_ Eu até entendo essa sua necessidade de brigar, mas nada justifica você ficar gritando essas agressões. Francamente estou mais decepcionado do que irritado com você. Sempre te considerei tanto e...

Não terminou de falar porque Boca Seca avançou com uma faca em sua direção, dando tempo suficiente para que ele se abaixasse, acertando o seu estômago. Caiu sentado e puxou seu revólver em direção a Suspirante, mas não contava que o brilho do sol lhe cegaria temporariamente, facilitando para que Baltazar o desarmasse dando um chute em sua mão.


_ Vai embora. Acabou. Nós estamos velhos. Essa rixa não faz mais sentido. Nunca fez, na verdade. Você só quer uma desculpa para morrer em combate. Nosso tempo acabou, aceite isso. Vai arrumar algum motivo para viver além do que tínhamos antes.

_ Eu não sei fazer outra coisa. Preciso da adrenalina.

Se levantou novamente para atacar Suspirante, mas levou um muro na boca que o fez cair sentado no chão novamente. Desesperado sacou o revólver e mirou, mas tomou um tiro na cabeça, caindo para trás.

_ Adeus, meu amigo. _ disse Baltazar com a voz embargada. _ eu sinceramente não entendo o que te levou a ser consumido em tanta raiva e mágoa, mas espero que você esteja bem agora.

Enterrou Boca Seca mais tarde naquele dia, sentou-se em frente ao seu túmulo e tomou uma cachaça em sua homenagem. Levantou-se ao pôr do sol e enquanto voltava para casa lembrou-se de toda a sua trajetória com seu amigo, esperando que alma do mesmo agora estivesse finalmente em paz.

segunda-feira, 11 de março de 2024

Teatronáticos no sertão dos jagunços

O grupo mambembe Alvorada, cujos membros eram Irina, Beto, Elis, Giovanni e Lourival, além do cachorro Mascate viajava se apresentando em pequenos vilarejos. Não se sabe ao certo quando ou como se reuniram, mas a paixão pela arte dramática era a cola que os tinha juntado para não mais separar. Cada um tinha o seu gênero de peça e autor predileto, mas sempre acabavam entrando num acordo.

Iam juntando peças e adereços à medida que iam passando pelos diferentes lugares e os incorporavam em suas histórias de variados temas. Também recontavam as coisas que ouviam ao longo de suas viagens, enriquecendo assim o conteúdo do espetáculo.


Ocasionalmente as diferentes personalidades se chocavam, mas sempre acabavam alcançando o equilíbrio. Irina e Beto eram os mais maduros, casados e muitas vezes acabavam agindo como os monitores da trupe. Elis era romântica e sonhadora, apaixonada por Giovanni que era mulherengo e intempestivo enquanto Lourival era desligado de tudo, vivendo em seu infinito particular.

A trajetória do grupo começou a sair dos eixos quando o galanteador acabou se envolvendo com a filha de um enfezado fazendeiro, o Coronel Gaspar que não aceitou que sua adorada princesa fosse “desonrada por um vagabundo sem eira nem beira” e colocou seus capangas atrás do moço para cortar fora a sua masculinidade.

A trupe então enveredou por uma trilha inédita às pressas, torcendo para evitar o pior. Não sabiam se a sua singela carroça iria suportar a travessia por dentro do sertão pedregoso e cheio de curvas fechadas. O cavalo Asdrúbal trotava devagar, como quem pressentia que algo muito ruim estava prestes a acontecer. Quando escureceu eles resolveram fazer uma pausa para retomar o caminho no dia seguinte. A líder estava possessa:

_ Eu estou com vontade de te matar! Olha a confusão em que você nos meteu! Você não pensa para fazer as coisas, esse é o seu problema!

_ E como é que eu iria saber que o pai da moça iria reagir desse jeito? Não fiz nada que já não tivesse feito antes.

Lourival acordou confuso de sua soneca, sem entender o que estava acontecendo. Depois que explicaram ele só respondeu “Ah, tá” e voltou a dormir.

_ Não acho bom fazermos uma fogueira. Vai chamar atenção para nós. A gente nem sabe o que pode encontrar por aí. Vamos acender o lampião, só para não ficarmos no breu completo. _ aconselhou Beto.

Elis se enroscou numa coberta. Estava com frio, medo e fome. Por fim perguntou baixinho:

_Tem alguma coisa para comer?

Layla pegou uma cesta que tinha ovos e picles em conserva, geleia alguns pães e biscoitos. Comida que ganhavam nas cidades em que se apresentavam. Não costumavam levar frutas porque pereciam muito rápido. Comeram para dormir logo em seguida. Acordaram cercados pelo bando de jagunços chefiados por Totonho Pimenta. Estavam particularmente interessados nas duas mulheres, por motivos óbvios. Todos estavam muito assustados com exceção de Lourival que perguntou:

_ Se quiserem espetáculo, tem que esperar a gente acordar, tomar café, banho. Respeito é a base de tudo, minha gente.

_ Esse cara tá bêbado? _ perguntou um dos jagunços que achou graça no discurso do lesado.

_ Não, ele é assim mesmo. _ respondeu Giovanni. _ se bem que ele come uma pasta meio estranha, feita com cogumelos.

_ Mostra aí.

_ Eu não vou dividir com você. É muito difícil de achar e tá no fim do pote. _ respondeu o ator segurando o vidro contra o estômago.

Por fim Totonho falou alto e interrompendo aquela discussão inútil:

_Olha, não sabemos quem são vocês e não queremos matar ninguém, mas queremos os mantimentos e as mulheres, porque os meus compadres precisam se divertir um pouco.

Beto pensou rápido e disse:

_ Vocês estão mexendo com forças que desconhecem. Minha esposa é uma cigana e irá jogar uma praga em todos vocês. Ela domina as artes místicas e não gosta de se aborrecer. Teve um homem que duvidou e tentou se aproveitar dela. Seus dedos da mão apodreceram e o que tinha no meio das pernas também. Despencou igual fruta do pé que amadurece demais, sabe?

De fato, Irina se apresentava fazendo Tarô e Quiromancia. Tinha muitas tatuagens com símbolos de runas nos braços e nas pernas que reforçavam esse aspecto sobrenatural do seu personagem, além da bandana de seda. Ela olhou com olhar ameaçador para os homens armados, como se os desafiasse. Foi o bastante para que eles ficassem receosos e mantivessem distância. Totonho ponderou e por fim disse:

_ Então uma só vai ter que dar conta.

Pegaram Elis, amarraram as suas mãos e a jogaram na garupa de um dos cavalos. A pobre moça chorava muito, já imaginando o pior. Um dos jagunços gritou que queria provar a pasta do maluco, mas foi ignorado. Levaram também a comida e Asdrúbal, para compensar pelo fato de terem deixado a cigana para trás.

_ E agora a gente faz o quê? _ perguntou Giovanni, que estava se sentindo bastante culpado por tudo aquilo.

_ Agora a gente os segue e resgata a nossa amiga. _ respondeu Beto.

_ E como a gente vai fazer isso?

_ Utilizando as nossas melhores habilidades. Lourival, vamos precisar da sua pasta.

_Tá bom! _ respondeu o maluco contrariado. _ só estou fazendo isso pela Elis.

Chegaram ao acampamento do bando através do rastro que tinham deixado com os cavalos, o que não foi exatamente desafiador para o grupo. A garota estava presa em uma das tendas, isolada como uma iguaria que seria apreciada mais tarde, primeiro pelo chefe e depois pelo resto dos capangas.

O mulherengo achou o recipiente onde eles guardavam água para cozinhar e besuntou tudo com o creme alucinógeno de seu amigo, especialmente a comida. Aproveitou e batizou um pouco da pinga também. Depois foi para junto de seus amigos e aguardou escondido até a droga fazer efeito.

_ Poxa, não sobrou nada. _ lamentou Lourival ao ver o pote vazio.

_ É por uma boa causa, depois você faz mais. _ respondeu Irina consolando o companheiro. O cachorro apoiou a cabeça em seu colo, como se quisesse fazer o mesmo.

Os jagunços se alimentaram para logo em seguida começar a tomar cachaça e cantar modas antigas, comemorando o deleite que teriam mais tarde com a pobre moça. De repente começaram a ficar afetados pelos barulhos da mata. Todos os sons foram ampliados e todos sacaram as suas armas em estado de alerta.

Beto pegou o seu megafone, que antigamente era apenas um cone de metal com dois orifícios e gritou:

_ Vocês irritaram os espíritos do plano místico! Agora serão castigados por terem desafiado forças que desconhecem!

Os jagunços assustados começaram a atirar em direção ao escuro. Em seguida ouviram Mascate latir no instrumento. Aquele som alto e distorcido os deixou bastante assustados. Enquanto isso Irina procurava por sua amiga e acabou encontrando Totonho, que viu as tatuagens de ramos de oliveira nos braços da cigana criarem vida e avançarem em sua direção, como se quisessem enforcá-lo. Puxou seu revólver e ela se jogou no chão, mas ele atirou mesmo assim, pois continuava “sendo atacado”. Foi andando para trás até tropeçar e cair sentado numa fogueira, onde sua roupa começou a pegar fogo. Avançou gritando em direção aos seus subordinados, que enxergaram um demônio horrível soltando fogo pelas costas e acabaram descarregando a sua munição nele.

Giovanni usou um extenso lençol branco para pendurar na ponta de um bambu e agitar no escuro, enquanto Beto gritava ameaças no megafone. Lourival assistia tudo aquilo e ria sem parar, como se estivesse assistindo a uma peça de teatro. Sua risada era tão diferente que o chefe da trupe fez a mesma ressoar ampliada no acampamento, assustando ainda mais os bandidos agitados.

Depois de passar um bom tempo procurando, Irina acabou encontrando sua amiga e a libertou. Quando se aproximaram do trio, o primeiro a correr em seu encontro foi Giovanni, que estava muito preocupado com ela.

_ Tive muito medo de te perder. _ disse o rapaz chorando. _ você não faz ideia do quanto é importante para mim.

_ Sou? _ perguntou a moça confusa. _ importante em que sentido? Como uma irmã?

_ Não exatamente. Pelo menos espero que não. Não, definitivamente não.

_ Como assim?

_ Eu acho você muito atraente.

_ Mas? _ adiantou Elis, já prevendo que de alguma maneira seria rejeitada.

_ Mas eu não consigo me comprometer com uma mulher só. Pelo menos não ainda. Quero você na minha vida, mas ao mesmo tempo não quero te magoar. Se você quiser um lance casual a gente pode...

_ Não daria certo porque eu me conheço. Eu iria me apaixonar e sofrer quando você me abandonasse.

_ Se você mudar de ideia, quem sabe um dia?

_ Quem precisa mudar a cabeça é você, que enfiou a gente nessa confusão porque não consegue controlar o que tem dentro das calças. _ rebateu Irina que já estava cansada de ficar consertando a bagunça daquele Casanova.

_ Agora a gente vai para aonde? _ Questionou Lourival.

_ Agora vamos embora antes que o efeito da droga passe. Vamos pegar nosso cavalo e sumir na mata.

Pegaram Asdrúbal e depois de prendê-lo novamente na carroça, partiram em direção à cidade mais próxima. Viajaram durante a noite, ganhando assim tempo para se distanciar dos seus agressores. Eventualmente acharam mais cogumelos e passaram a fazer um estoque para emergências. Irina encostou a cabeça no ombro do marido e disse:

_ Ainda bem que escapamos com vida. Foi por muito pouco.

_Eles nunca tiveram chance contra nós. Nosso potencial de engenhosidade é superior a qualquer arsenal que possam criar.

A cigana sorriu, percebendo que foi obrigada a concordar com ele.

Meu novo livro está disponível para venda!

Link para comprar!